“Por
mais brilhante que sejas, se não fores transparente, tua sombra será escura”.
O MOLEIRO DE SANS-SOUCI
O moleiro de Sans-Souci - Jayme José
de Oliveira - Litoralmania ®
A liberdade de imprensa é um dos esteios da
Democracia, sem ela a Democracia não passa de uma ficção, de uma ditadura
disfarçada. Sim, quando não é possível divulgar os atos de qualquer setor da
população – e o governo se encaixa nisso - ocupa os postos mais elevados e
relevantes – e, pior, eventualmente ocorrem episódios de impedimento por via
judicial de malfeitos, de desmandos, a corrupção ocupando o ápice, nada nos
resta para nos dar esperança num futuro JUSTO. Os
“mais iguais” - retratados por George Orwell na memorável obra “A Revolução dos
Bichos” - se refestelam nas fímbrias da lei (lei com letras minúsculas), pois a
LEI não se deixa manobrar por juízes que, ao contrário da deusa Thêmis, não
usam vendas que lhes permitam julgar SEM RECONHECER os indigitados. A um JUIZ
que faça jus ao posto não importa o fato de ter diante de si um presidente, um
governador, um prefeito ou um morador de rua sem eira nem beira. São todos
seres humanos que merecem respeito, todos estão sujeitos aos ditames da
Constituição.
Numa Democracia os “mais iguais” são iguais a todos.
Sem exceções.
Todo este preâmbulo para abordar um assunto que se
arrasta há cinco meses e percorreu caminhos tortuosos antes da decisão do
ministro Gilmar Mendes, do STF.
Os veículos do Grupo RBS puderam tornar pública uma
reportagem do jornalista Giovani Grizotti revelando detalhes de uma delação
premiada que envolve o prefeito de Bagé Divaldo Lara (PTB), que recorreu à
Justiça para impedir sua divulgação.
A juíza de primeira instância, Tatiana Di Lorenzo,
havia impedido os veículos do Grupo RBS de realizar qualquer divulgação
jornalística, por qualquer meio de informações ou vídeos, sobre a declaração do
sócio de uma organização de interesse social que acusa Divaldo de cobrar
propina da até R$ 40 mil mensais para liberar pagamentos por serviços
terceirizados prestados à prefeitura de Bagé.
“No dia 10 de janeiro de 2022, por meio de liminar, o
ministro do STF Gilmar Mendes, derrubou a censura prévia que já está sepultada
pela Constituição, mas volta e meia levanta da tumba para assombrar quem
acredita na liberdade de imprensa”. (Zero Hora, 12/01/2022)
O ministro escreveu que o fato de o repórter dispor de
informações sigilosas oriundas de inquérito policial que lhe foram repassadas
por terceiros “não implica, por si só, na
ilicitude das atividades exercidas pelo jornalista, tampouco legitima a interferência
prévia do Poder Judiciário para obstar a publicação da matéria, sob pena de
afronto à liberdade de expressão”.
O ministro Ayres Britto, ex-presidente do STF, ensinou
que manter o sigilo é responsabilidade de quem o detém. Se o jornalista consegue
furar o bloqueio para obter a informação, tem todo o direito de publicá-la em
nome do interesse público. “Somente uma
imprensa livre e sem restrições pode efetivamente expor os atos equivocados dos
membros do Estado”.
O inciso 9º do artigo 5º da Constituição Federal
explicita de forma inequívoca: “É livre a
expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação,
independentemente de censura ou licença”.
Nos dias atuais estamos vivenciando desencontros entre
autoridades e o STF. Mesmo concordando que, por vezes, algumas decisões possam
ser consideradas discutíveis, o Judiciário merece nosso apoio porque a sua
função é garantir os direitos individuais, coletivos, sociais e resolver
conflitos entre cidadãos, entidades e o Estado. Para isso tem autonomia administrativa
e financeira, garantida pela Constituição Federal.
Já houve casos pretéritos, um deles com desfecho
semelhante. O ministro Ricardo Lewandowski, do STF, derrubou, no dia 7 de
novembro de 2018, a censura imposta pelo TJ/DF ao jornal Estado de São Paulo
que, desde 2009, estava proibido de publicar reportagens sobre a Operação
Faktor. Um dos alvos da operação era o empresário Fernando Sarney, filho do
ex-presidente José Sarney. O jornal informa que ficou 3.327 dias sob censura.
Pensas que são raros os que sonham em por “cabresto”
na imprensa? Ledo engano, políticos sonham com o dia em que apenas um “Pravda”
(Rússia) ou um “Granma” (Cuba) estarão ao alcance do público.
“Vamos ter de regulamentar as redes sociais, regular a
internet e colocar um parâmetro”. (Lula)
https://www.youtube.com/watch?v=WkmJ6g-eZGc
Lula pensa que pode determinar o que se pode dizer o
que não pode ser dito? Nem ele, nem Bolsonaro, nem FHC, nem Dória, nem ninguém.
Em qualquer Democracia que se preza os limites são estabelecidos por lei e não
há censura prévia. Quando alguém ultrapassa os limites da lei; calunia, ofende,
a Justiça determina uma eventual reparação.
Jair Bolsonaro não gosta da imprensa, não foram raras as vezes que
ofendeu, agrediu jornalistas.
https://www.youtube.com/watch?v=5VZSUlMUqEI.
A diferença com as atitudes de Lula é que um agride e
o outro quer calar. A maior dificuldade que ambos têm é a inconformidade de
conviver com um ambiente livre. E AÍ MORA O PERIGO!
Dois pensamentos paradigmáticos:
“Para quem acha que o mundo gira à
sua volta, vá ao médico, pode ser labirintite”.
“Síndrome da abelha: gente que pensa que é rainha, mas é só um inseto”.
A propósito, o professor da Unisinos e Procurador da
Justiça do Rio Grande do Sul, Lênio Streck, apresentou no programa de televisão
“Direito e Literatura: do fato à ficção” o
conto de François Andrieux: “O Moleiro de Sans-Souci”. Frederico
II, rei da Prússia, (1712-1786) passou para a História como um homem de
conhecimento vasto, amigo de intelectuais que frequentavam seu castelo de verão
em Postdam, nos arredores de Berlim. O
rei resolveu construir um refúgio anexo para esses encontros com
intelectuais.
Havia na vizinhança um moinho e seu dono ficou conhecido como o Moleiro
de Sans-Souci, nos versos de François Andrieux. Frederico enviou
emissários para intermediar a compra do local do moinho. O moleiro recusou-se a vender.
Inconformado com a recusa, o próprio rei dirige-se a Sans-Souci e
disse-lhe:
“Você bem sabe que, mesmo que não
me venda a terra, eu, como rei, poderia toma-la, sem nada pagar”.
Nesse instante, o moleiro retrucou ao rei:
“O senhor! Tomar-me o
moinho”? “Isso
seria verdade se não houvesse juízes em Berlim”.
Nesse instante, relatam os livros de teoria do
respeito ao Direito, o rei recuou e deixou o moleiro em paz. Pois, por sua
resistência às pretensões injustas do monarca e por possuir confiança na
Justiça, que não se verga aos interesses dos poderosos!
Jayme José
de Oliveira
cdjaymejo@gmail.com
Cirurgião-dentista aposentado
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