segunda-feira, 21 de março de 2016

CATILINÁRIAS



PONTO E CONTRAPONTO - por Jayme José de Oliveira
“Por mais brilhante que sejas, se não fores transparente, tua sombra será escura”.


http://www.litoralmania.com.br/catilinarias-por-jayme-jose-de-oliveira/

CATILINÁRIAS
A humanidade parece ter inserido em seu DNA alguns procedimentos que perpassam os tempos e se repetem ciclicamente. Alguns impulsionam a civilização para o destino que será atingido cedo ou tarde: o convívio pacífico, harmonioso e socialmente justo para toda a população. Ao contrário da “Utopia” de Thomas Morus, não haverá a uniformidade que se observa nas colmeias, afinal de contas os homens são idiossincráticos e se diferenciam individualmente. O que almejamos é uma vida digna para todos, cada qual com seu potencial atingido, dentro de suas potencialidades.
Outros, e Catilina não é exceção, comprazem-se em tirar vantagem em tudo – “Lei de Gerson” – e, quando por desídia, falta de talento ou de persistência não atingem seus objetivos, a falta de escrúpulos inerente em suas mentes deformadas apela para recursos escusos. Desde sempre e não sabemos até quando.
Em 63 a.C. Marco Túlio Cícero, o maior filósofo romano de todos os tempos, ocupava o posto de cônsul, cargo máximo do Senado. Descobriu que o senador Lúcio Catilina, arruinado por dívidas era o mentor duma conspiração que tramava tomar o poder e contava com o apoio de homens ricos e militares financeiramente arruinados.
Ao se inteirar desses planos, Cícero convocou uma reunião do Senado e pronunciou o primeiro dos quatro célebres discursos contra Catilina, que ficaram conhecidos como “Catilinárias”. A intervenção de Cícero se tornou um clássico da política e passou ser invocado ao longo dos últimos dois mil anos sempre que um homem público ou corporação atenta contra o interesse geral da população.
Por fim Cícero conseguiu sufocar a revolta de Catilina e deu uma sobrevida ao Império Romano.
“Até quando, Catilina, abusarás da nossa paciência?
Por quanto tempo a tua loucura há de zombar de nós?
A que extremos se há de precipitar a tua desenfreada audácia?
Nem a guarda do Palatino, nem a ronda noturna da cidade, nem o temor do povo, nem a afluência de todos os homens de bem, nem este local tão bem protegido para a reunião do Senado, nem a expressão do voto destas pessoas, nada disto conseguiu perturbar-te?
Não te dás conta que os teus planos foram descobertos?
Não vês que a tua conspiração a têm já dominada todos estes que a conhecem?
Quem, dentre nós, pensas tu que ignora o que fizeste na noite passada e na precedente, onde estiveste, com quem te encontraste, que decisão tomaste?
Oh tempos, oh costumes!”
O primeiro e o último destes discursos foram dirigidos ao senado de Roma, os outros dois foram proferidos diretamente ao povo romano. Todos quatro foram compostos para denunciar explicitamente Lúcio Sérgio Catilina.
No ano seguinte o rebelde caiu, vindo a morrer no campo de batalha.
O Brasil atravessa uma fase conturbada de sua história, porém, como nos tempos de Cícero, não se antevê o futuro como uma tragédia irreversível. Pode-se avistar uma luz no fim do túnel.
Quando, e se, despirmos o intolerante manto do sectarismo e admitirmos que fomos e somos todos partícipes do descalabro que se instalou e se avoluma a passos largos, poderemos redirecionar a rota e nos desviarmos do iceberg ali adiante. Ao contrário do Titanic que soçobrou devido à falsa sensação de indestrutibilidade e à soberba do comandante, unindo esforços e batalhando ombro-a-ombro sem distribuir rasteiras, realinharemos não apenas a economia mas, principalmente, o conviver irmanados como têm preconizado incessantemente o Papa Francisco. Senão...


 
Cicero acusando Catilina no senado (Afresco de Cesare Maccari, século XIX)


Nenhum comentário:

Postar um comentário