“Por
mais brilhante que sejas, se não fores transparente, tua sombra será escura”.
VACINAS
Se muitos decidem não tomar vacinas – e impedir que
familiares o façam – estão coletivamente agindo para que outros morram ou
fiquem sequelados. O Estado não pode permitir isso, muito menos estimular.
Não há problema em inserir vacinas entre as obrigações
que possam ser impostas caso não se obtenha êxito nas tentativas de induzir a
população utilizando a mídia para tanto. A vacinação não atinge seus objetivos
– salvar vidas – quando depender apenas de decisões individuais. Só funciona
quando aplicada de forma maciça.
Se a população não se torna receptiva a uma campanha
organizada, o governo não tem apenas o direito, tem a obrigação de adotar
medidas coercitivas – o uso do cinto de segurança enfrentou uma oposição
ferrenha antes de se introjetar nos hábitos dos motoristas.
O direito do
coletivo prepondera, inequivocamente, sobre o direito individual. Somos uma
organização multicultural e mesmo em pleno regime democrático a liberdade
individual não pode, jamais, preponderar. Quando o “EU” tenta se sobrepor ao
“NÓS”, isso não é democracia, é anarquia e resulta numa sociedade anômica onde
o que vige é a “Lei de Gerson”. Quando determinada pessoa, empresa ou
corporação obtém vantagens ou exige direitos de forma indiscriminada, sem se
importar com questões éticas, morais e, muito menos com os direitos dos outros
elementos com os quais convive, está ultrapassando todos os limites.
O exemplo mais impactante, no Brasil, ocorreu durante
o mês de novembro de 1904. O Rio de Janeiro, então capital federal, foi palco
de uma das maiores revoltas urbanas ocorridas no país: a Revolta da Vacina.
Milhares de habitantes protagonizaram nas ruas da cidade violentos conflitos
com a polícia. O motivo era uma polêmica medida tomada pelo governo de
Rodrigues Alves que convocou o sanitarista Oswaldo Cruz e impôs um ambicioso
plano de saneamento da cidade.
A febre amarela, a malária, a varíola, a peste
bubônica, o tifo, a tuberculose grassavam . Para proteger a saúde pública o
projeto envolvia controvertidas medidas de controle da população e de seus
hábitos de higiene. Tendo como meta controlar as epidemias organizou-se uma
grande equipe de “mata-mosquitos” e uma declarada guerra aos ratos. No entanto,
a medida profilática que mais revolta provocou foi tornar a vacina obrigatória,
que passou a ser condição “sine qua non” para matrícula em escolas, admissão em
empresas, casamentos e outras atividades. A vida social daquele que se
recusasse tornar-se-ia impossível.
Na época a revolta representou um protesto contra o
propósito de modernização que estava em curso e, a longo prazo redundou na
elevação do padrão de vida da população, principalmente do segmento mais pobre.
Foi um gesto intimorato do presidente Rodrigues Alves,
coordenado pelo médico sanitarista Oswaldo Cruz. A esses homens de visão,
dispostos a enfrentar uma oposição ferrenha, o Brasil agradece e tem um débito
de gratidão eterno.
O simples fato de se tornar imperioso o debate atual
sobre a polêmica vacina obrigatória representa uma derrota. Da ciência. Da
humanidade. O fato de estarmos em risco de perder conquistas civilizatórias por
comportamentos irresponsáveis e obscurantistas nos direciona a reagir ao perigo
de andar para trás, para 116 anos de retrocesso. Já aconteceu antes, não pode
se repetir. Não permitamos que ocorra o abandono da ciência com prevalência da
ignorância.
Não enveredemos pelas tortuosas trilhas que conduzem
ao lugar nenhum, lindeiro do debacle.
No Brasil, na Europa, nos Estados Unidos, os
“antiwaxxers”, como são chamados por lá, vão ganhando proeminência paulatinamente
nos últimos anos, apoiados em artigos científicos fraudados e de péssima
qualidade. Infelizmente, é um movimento que ameaça ganhar forças no Brasil.
Em 1904 a campanha “Ninguém Pode Obrigar Ninguém a
Tomar Vacina” foi catastrófica, não permitamos a reprise de uma campanha não só
contra a vacina obrigatória, mas contra a própria vacina. Abracemos a solução
que surge para estancar uma hecatombe com óbitos já perto de 200 mil vítimas no
cômputo oficial, sabidamente subnotificado. Ninguém pode prever o quanto nos
dizimará.
A solerte campanha estigmatizará quem a divulga. As
vítimas, seus familiares e a nação horrorizada jamais perdoarão.
Jayme José
de Oliveira
cdjaymejo@gmail.com
Cirurgião-dentista aposentado