sexta-feira, 23 de outubro de 2020

LEI & JUSTIÇA

 


\PONTO E CONTRAPONTO - por Jayme José de Oliveira

“Por mais brilhante que sejas, se não fores transparente, tua sombra será escura”.

 

LEI&JUSTIÇA – 17/10/2020

A humanidade, para subsistir de maneira digna, deve se submeter a leis e estas obedecidas, não importa por quem. A jurisprudência deve estabelecer garantias, impor direitos e deveres equivalentes, apesar das diferenças existentes. Os “mais iguais” que se consideram acima da lei são uma nódoa que sempre existiu e é nosso dever lutar para que seja cada vez menos evidente. Sem isso o caos reina e impera a lei do mais forte; a lei do mais rico; a lei do mais poderoso; o império de quem considera a lei um empecilho para os seus objetivos.

O ministro Edson Fachin, relator da Lava Jato, em mensagem ao novo presidente do STF, Luiz Fux, ressaltou que há necessidade premente de realizar julgamentos com parâmetros iguais para todos os réus:

 O sistema é injusto e desigual para a parcela menos abonada da população e leniente com os poderosos às voltas com práticas criminosas.

Endinheirados e poderosos têm privilégios para burlar a lei sem serem incomodados ou, quando julgados, os advogados recorrem a instâncias que muitas vezes protelam a condenação até ocorrer decurso de prazo. Edson Fachin argumenta que o trabalho de combate à corrupção desenvolvido pela Lava Jato deve ser visto como o aprimoramento da jurisprudência por mais eficiência na Justiça e qualidade na prestação de serviços públicos.

Para desespero dos “mais iguais” a Lava Jato assestou seus holofotes para este setor até então impune. Polícia Federal, Ministério Público, Juízes Federais, Tribunais de Primeira Instância e Segunda Instância semearam o pânico. Figurões políticos, empresas poderosas, construtoras de âmbito internacional e outras megaempresas sentiram o braço longo da lei apontar para seus desmandos.

A reação estrugiu de pronto e os resultados não se fizeram esperar. Medidas de contra-ataque foram lucubradas partindo dos mais altos escalões, inclusive do Poder Legislativo tentando, e de certo modo conseguindo neutralizar a ação moralizadora. Surgiram em sequência:

STF DECIDE QUE CUMPRIMENTO DA PENA DEVE COMEÇAR APÓS ESGOTAMENTO DE RECURSOS. A decisão tomada em 07/01/2019 não afasta a possibilidade de prisão antes do trânsito em julgado, desde que sejam preenchidos os requisitos do Código de Processo Penal para a prisão preventiva.                   Em fevereiro de 2016 o STF havia decidido, por 7 votos a 4 e mantido em nova decisão em outubro 2016, por 6 votos a 5, a prisão após condenação criminal em segunda instância.

LEI Nº 13.869, DE 5 DE SETEMBRO DE 2019 – Dispõe sobre os crimes de abuso de autoridade; altera a Lei nº 7.960, de 21 de dezembro de l989. Inibe a Polícia, o Ministério Público e juízes.

JUIZ DE GARANTIAS, proposto na chamada Lei Anticrime seria uma função exercida no processo criminal por um Juiz de Direito encarregado de atuar como garantidor da eficácia do sistema de direitos e garantias fundamentais do acusado no processo penal e, especialmente de dispor sobre a prisão provisória de uma pessoa investigada e seus respectivos pedidos de liberdade provisória. Também seria responsável por analisar os pedidos de medidas cautelares formulados durante o inquérito; disporia sobre pedidos de prorrogação de internação psiquiátrica compulsória, previsto por lei para ser instituído no Brasil.

A LAVA JATO, apesar dos percalços que lhe foram antepostos, não se intimidou nem recuou, poderososs foram investigados e sofreram punições severas em razão das providências tomadas pelo Ministério Público, Juízes Federais de Primeira e Segunda Instância, apesar da leniência com que foram tratados. O resultado dessa dualidade contribui para manter a pecha de ser o Brasil o país da impunidade aos “mais iguais” e rigoroso com os três pês: pretos, pobres e prostitutas.

Mais recentemente, o Ministro do STF Marco Aurélio de Mello aplicou a regra dos 90 dias do Código de Processo Penal para determinar a soltura de André do Rap. De posse da decisão de Marco Aurélio, André do Rap deixou a penitenciária, no município de Presidente Venceslau (SP), na manhã de sábado (10/10/2020). Informou à Justiça que iria para sua casa no Guarujá, no litoral de São Paulo, mas não o fez. O traficante teria seguido de carro até Maringá (PR), onde os investigadores suspeitam que tenha pego um voo particular para o Paraguai. O paradeiro dele é agora ignorado.

A soltura de André do Rap — apontado como um dos principais líderes do PCC — provocou um embate verbal entre os ministros Marco Aurélio de Mello e Luiz Fux. O presidente do STF cassou na liminar de Marco Aurélio de Mello e causou constrangimento na Corte. Em reunião plenária, no dia 15/10/2020, O STF decidiu manter a decisão de Fux e também fixar a tese de que o descumprimento do artigo que baseou a liminar não gera soltura automática dos presos.

 

 Juízes ditos garantistas acreditam que a regra é mais importante que o homem. Uma vez estabelecida uma norma é preciso cumpri-la, mesmo que isso possa prejudicar a sociedade. Cumpre deixar bem claro que renunciar à presença humana na interpretação das leis é uma falácia e pode nos conduzir à supremacia da frieza tecnológica sobre a justiça. Os advogados de defesa e promotores apresentariam seus argumentos e, sem riscos de erros, personalismos ou influências dos “mais iguais”, as sentenças seriam prolatadas ignorando quaisquer gravames, precedentes ou situações atenuantes.

 

A liminar acima relatada representa o quanto se pode beneficiar um criminoso quando deixamos de considerar significantes circunstâncias que podem dar liberdade a pessoas que, provavelmente, continuarão a praticar atos inaceitáveis pela sociedade.  

 

Por outro lado, delinquentes de menor porte, mesmo os que praticam delitos de menor gravame poderiam ser punidos como o foi Jean Valjean, o homem que por ter furtado um pão, foi condenado a 19 anos de prisão. Lembro a portentosa obra “Os Miseráveis” de Vitor Hugo, uma poderosa denúncia a todos os tipos de injustiça efetuada quando se segue a letra fria da lei.

 

Jayme José de Oliveira
cdjaymejo@gmail.com
Cirurgião-dentista aposentado


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