Coluna publicada em
"www.litoralmania.com.br", 11/04/2.016
http://www.litoralmania.com.br/a-moralidade-da-corrupcao-por-jayme-jose-de-oliveira/
“Por
mais brilhante que sejas, se não fores transparente, tua sombra será escura”.
A MORALIDADE DA CORRUPÇÃO
No capítulo X de "Cândido,
ou o Otimismo", romance filosófico escrito por Voltaire a bordo do navio
que o conduzia ao Paraguai, o personagem título, relembrando o filósofo
Pangloss, dizia aos seus companheiros de viagem: "Vamos para um outro
universo. É lá sem dúvida que tudo está bem, pois cumpre confessar que em nosso
mundo não faltava o que chorar quanto ao lado físico e moral das coisas".
Plagiando Voltaire, atrevo-me a
dizer que em nosso país não falta o que chorar quanto ao lado físico moral das
coisas, principalmente da política. Há ainda outras coincidências entre essa
obra de Voltaire e o ambiente político e o descompasso social, há séculos,
vigorantes no Brasil. Observem como se comportam os políticos e a sociedade
brasileira. No fundo, há uma relação de promiscuidade entre ambos; a única lei
que, no paradoxo brasileiro, é levada ao pé da letra é a lei (não escrita) de
Gérson: "Gosto de levar vantagem em tudo, certo? Leve vantagem você
também". (Luiz Antônio Flot)
Auditoria
do tribunal identifica 578 mil beneficiários irregulares no programa do INCRA e manda paralisar imediatamente o
programa de reforma agrária em todo o país.
São
dezenas de problemas identificados pela Corte, entre os quais a relação de
1.017 políticos (847 vereadores, 96 deputados estaduais, 69 vice-prefeitos, 4
prefeitos e 1 senador) que, criminosamente, receberam lotes do programa. Há
1.151 que já tinham falecido cadastrados como beneficiários. A auditoria revela centenas de casos
bizarros, como a concessão para pessoas de alto poder aquisitivo, donas de
veículos de luxo como Porsche, Land Rover ou Volvo.
As
irregularidades atingem 30% da base, de 1,5 milhão de famílias. Em 11 mil
casos, o cônjuge de uma pessoa beneficiada é novamente atendido por uma segunda
moradia. A precariedade é tanta que há pessoas com um ou dois anos de idade que
receberam imóveis. Milhares de beneficiários têm cargos públicos, o que é
proibido por lei. Foram encontrados ainda 61 mil empresários contemplados.
O
ministro relator do processo, Augusto Shermann, relembrou que o INCRA têm
descumprido há anos determinações feitas pelo tribunal. É um processo que está
sendo feito totalmente à margem da lei. (Zero Hora, 07/04/2.016)
A
paralização dos assentamentos ocorre num momento político delicado, exatamente
quando o Palácio do Planalto busca apoio para a presidente em movimentos
sociais como a CONTAG e o MST. Espera-se que o governo não trate do assunto
como mais uma conspiração política e aja imediatamente no sentido de corrigir
esse esquema fraudulento. (Zero Hora, 08/04/2.016)
O
recrudescimento do clima de hostilidades está num crescendo insopitável e ambas
as partes se esmeram em jogar combustível na fogueira de vaidades,
ressentimentos, ódio, intolerância. Partidários da tese do impeachment chegaram
ao absurdo de pichar as residências da presidente e dum juiz do STF. Em
contrapartida, defensores da manutenção do mandato de Dilma Rousseff revidam,
inclusive ameaçando com invasões de gabinetes e propriedades, não descartando
providências ainda mais violentas.
Numa cerimônia no Palácio do
Planalto para a regularização de terras dos quilombolas e para a reforma
agrária, com a presença da presidente Dilma Roussseff, o secretário da CONTAG,
Aristides dos Santos defendeu a violência e a invasão de terras.
“A forma de enfrentar a bancada
da bala contra o golpe é ocupar as propriedades deles ainda lá nas bases, lá no
campo. É a CONTAG, os movimentos sociais do campo que vão fazer isso. Ontem
dizíamos na passeata, vamos ocupar os gabinetes, mas também as fazendas deles
porque se eles são capazes de incomodar o ministro do STF, nós vamos incomodar
também as casas, as fazendas e as propriedades deles”.
No fim da cerimônia a presidente
Dilma Rousseff disse que é preciso resistir sem recorrer à violência ao que chamou
de tendências antidemocráticas.
Somente reconhecendo a
essência da nossa natureza é que conseguimos encontrar caminhos civilizatórios
mais dignos e possíveis. A constatação que salta aos olhos é observância, pelos
oportunistas, de que os “mais iguais” (George Orwell – A Revolução dos Bichos)
são os que “se dão bem na vida” e devem ser imitados. Uma consequência é a
difusão, até mesmo entre pessoas de alto nível intelectual, de que combater a
corrupção é não apenas inútil como contraproducente: a corrupção, como a
lendária Hidra de Lerna, quando tem uma das cabeças cortadas, surgem duas para
substituir. A professora Celi Pinto – cientista política e professora de
história da UFRGS (Zero Hora, 24/01/2.016) afirmou: “Reduzir a corrupção do PT
seria um formidável salvo-conduto para ela continuar a não importar”.
Otimista
por natureza, apesar do clima adverso que insiste em nos impingir o desencanto,
prefiro apoiar o pensamento do advogado Sebastião Ventura Pereira da Paixão
(Zero Hora, 22/01/2.016): “As pessoas
decentes usam a moralidade como uma adequação dos meios aos fins: se querem ser
bem-sucedidos, usam o trabalho honesto e dedicado a tal finalidade; se querem
respeito público, procuram agir com retidão, hombridade e responsabilidade
social”.
Os
corruptos e corruptores que infestam a política brasileira são produtos duma
sociedade apática que gosta muito de falar de moralidade, mas que não se
preocupa em traçar uma vida moral a todos: a maioria de bem é dispersa,
desunida, acomodada e não deixa de aproveitar “oportunidades”, quando elas surgem.
Rendo minhas sinceras homenagens aos que se mantém imunes às tentações do
dia-a-dia: furar uma fila; excesso de velocidade numa estrada deserta e sem
pardal; apelar para que um conhecido com acessibilidade nos facilite trâmites
burocráticos; etc.
A
doentia moralidade da corrupção é roubar e seguir roubando.
Só há
um jeito de mudar: uma nova, enérgica e eficaz atitude cívica.
Vem ou
vai ficar na poltrona?
Jayme José
de Oliveira
cdjaymejo@gmail.com
Cirurgião-dentista aposentado
cdjaymejo@gmail.com
Cirurgião-dentista aposentado
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