Coluna publicada em "www.litoralmania.com.br" - 23/06/2018
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“Por
mais brilhante que sejas, se não fores transparente, tua sombra será escura”.
MEDICINA
ATRAVÉS DO TEMPO
A medicina
já foi definida como “um conjunto de verdades provisórias”. Por isso mesmo ela
se presta a mudanças de conceitos e condutas, na dependência do seu estágio de
desenvolvimento e do embasamento teórico de que dispõe para fundamentar a
prática médica. Por outro lado, por mais científica e técnica que seja jamais
consegue desvencilhar-se do seu componente de subjetivismo.
Quando as
doenças eram consideradas um castigo que os deuses impunham à humanidade pelos
seus pecados, os sacerdotes, curandeiros e charlatães se arrogavam o poder de
curá-las ou interceder perante as divindades. Em todas as civilizações, mesmo
as mais incultas. O curandeirismo é tão antigo como as doenças. O homem sempre
acreditou numa força invisível capaz de curar com um simples gesto ou toque de
mãos. O grego Hipócrates, o pai da medicina, considerava a cura pelas mãos
prática natural. Os primeiros cristãos achavam que era manifestação do Espírito
Santo. Durante séculos tal prática sobreviveu e 43 praticantes chegaram a ser
considerados santos. Na Idade
Média caíram em desgraça e seus poderes atribuídos ao diabo. A partir de 1136
os monges foram impedidos de exercer atividades médicas e quem tentou driblar a
proibição foi parar na fogueira, assim como as feiticeiras. Nos tempos modernos o princípio do magnetismo, teoria surgida no século
XVIII tornou conhecido o médico alemão Franz Anton Mesmer. Na Rússia Rasputin
influenciou os czares e seu poder era incalculável. Médiuns espíritas alegam
que incorporam espíritos de médicos já falecidos e, em todos os países, têm seu
séquito de seguidores. A medicina atual proclama o valor da psicologia no
tratamento e os fatores psicossomáticos são considerados de fundamental
importância. A ciência não destruiu os fatores psicológicos, incorporou-os e os
resultados são alvissareiros.
Práticas atualmente
descartadas tiveram seu uso consagrado por largos períodos. Povos de todas as
latitudes e civilizações utilizaram-se da SANGRIA como terapêutica polivalente
em quase todas as doenças. Inicialmente como um ritual impregnado de conteúdo
místico e posteriormente sob o fundamento de doutrinas que justificavam tal
prática, ou que foram elaboradas para que a coonestassem (Seigworth, 1980, pp.
2022-208). Barbeiro-cirurgião era
uma das profissões mais comuns na área médica durante
a Idade Média, eram geralmente incumbidos do
tratamento de soldados durante
ou após batalhas. Nesta
época, cirurgias em geral não eram realizadas por médicos, mas por
barbeiros que também faziam pequenas cirurgias nos ferimentos dos camponeses
e sangrias. Os babeiros-cirurgiões fixavam
residência próxima a castelos, onde
também forneciam serviços para os abastados.
Uma variante da sangria consistia na aplicação
de sanguessugas. As sanguessugas (Hirudo medicinalis) são anelídeos que vivem
em águas estagnadas, represas e lagos, e que se alimentam de sangue de animais
que penetram nessas águas. São dotadas de uma ventosa na extremidade proximal,
por onde sugam o sangue; cada exemplar pode sugar entre 10 e 15 ml de sangue.
Entre os
tratamentos milenares que subsistem até a atualidade não podemos esquecer a
FITOTERAPIA, baseada na nossa flora. Até hoje inesgotável fonte de
matéria-prima para os laboratórios farmacêuticos.
A ALOPATIA, sistema ou método de tratamento em que se
empregam remédios que, no organismo, provocam efeitos contrários aos da doença
em causa é o
oposto da HOMEOPATIA, método terapêutico que consiste em prescrever a um doente, sob uma forma
diluída e em pequeníssimas doses, uma substância que, em doses elevadas, é
capaz de produzir num indivíduo sadio sinais e sintomas semelhantes aos da doença
que se pretende combater (este método foi criado, no fim do século XVIII pelo
médico alemão Samuel Hahnemann 1755-1843). É uma luta de princípios, com primazia
para o primeiro.
A
SÍFILIS durante séculos foi um flagelo da humanidade. Doença crônica,
sexualmente transmissível, sua evolução transcorre em décadas e tem como
desfecho uma alienação mental ou paralisia (quando ataca a coluna vertebral).
Durante a virada do século XIX para o XX a comunidade médica tentava lidar com o crescente número de pacientes acometidos pela sífilis e as técnicas até então disponíveis para o tratamento eram pouquíssimo promissoras.
Durante a virada do século XIX para o XX a comunidade médica tentava lidar com o crescente número de pacientes acometidos pela sífilis e as técnicas até então disponíveis para o tratamento eram pouquíssimo promissoras.
Ao
longo da história, a FEBRE se mostrou benéfica no tratamento de diversas
doenças e remonta a Hipócrates (século IV a.C.). A utilização dos acessos
febris provocados pela malária no tratamento da paralisia geral progressiva
foi proposta, em 1917, pelo médico austríaco Julius Wagner-Jauregg. A técnica,
batizada de malarioterapia, consistia na inoculação de sangue contendo um dos
agentes etiológicos da malária, o protozoário da espécie Plasmodium vivax em
doentes portadores desta forma de sífilis nervosa. A técnica passou a
ser conhecida, utilizada e estudada em diferentes países do mundo, inclusive no
Brasil.
O
arsenito de potássio (KAsO2) em solução aquosa – Licor de Fowler – também foi
usado até época recente, antes da penicilina se tornar a terapêutica
definitiva. As duas técnicas acima descritas ainda eram utilizadas no decorrer da
década de 1950, conheci dois casos pessoalmente.
Após este retrospecto histórico
ingressamos no presente, com pés no futuro de terapias já em uso e outras prestes
a nos beneficiar.
VÍRUS ZIKA ATACA E DESTRÓI CÂNCER EM
EXPERIMENTO CIENTÍFICO BRASILEIRO
Estudo feito por cientistas da Universidade de São
Paulo sugere que, no futuro, o vírus zika poderá ser usado para tratar tumores
no cérebro. O vírus é conhecido por sua preferência
por infectar células tumorais do cérebro e matá-las com grande eficiência, sem
causar danos às células saudáveis. (Alvin Baez/Reuters). Segundo Keith Okamoto, autor principal
da pesquisa, estudos anteriores já haviam mostrado que o vírus da zika tem uma
grande afinidade por células do sistema nervoso central, em especial as
células-tronco neurais, que dão origem aos neurônios. Assim, quando um feto é
infectado, o vírus ataca seu sistema nervoso e reduz drasticamente a quantidade
de células-tronco neurais, gerando problemas como a microcefalia. Estudos
feitos pelo grupo da USP sobre tumores do sistema nervoso central mostravam que
as células que compõem esses tumores têm características semelhantes às das
células-tronco neurais e estão ligadas ao processo de disseminação do câncer –
a metástase. “Essas
células tumorais são especialmente resistentes aos tratamentos convencionais
como quimioterapia e radioterapia. Por isso decidimos investigar se o vírus da
zika, que infecta células-tronco normais, poderia também infectar e matar as
células tumorais que têm características de células-tronco”, disse Okamoto.
Para realizar
a pesquisa, os cientistas infectaram com zika células humanas derivadas de dois
tipos de tumores cerebrais que afetam especialmente crianças de até cinco anos
de idade: meduloblastoma e tumor teratóide rabdóico atípico. Em
um dos experimentos, os pesquisadores utilizaram essas células tumorais humanas
para induzir o crescimento de tumores cerebrais “humanos” em camundongos. Depois de desenvolver o
câncer em estágio avançado, os animais receberam uma injeção com o vírus da
zika. Os tumores regrediram em 20 dos 29 animais tratados com o vírus – em sete
deles, a remissão foi completa e o tumor desapareceu. O vírus também bloqueou e
reverteu metástases. Segundo o cientista, o fato do vírus da zika não afetar
os neurônios maduros é crucial do ponto de vista da segurança, já que a
destruição de neurônios saudáveis seria uma barreira para o uso do vírus em uma
futura terapia contra o câncer cerebral. Okamoto conta que essas propriedades já
haviam sido observadas em outros vírus e a estratégia do uso de vírus como
“arma” contra o câncer já é uma realidade. Como foram utilizadas células de
tumores humanos nos camundongos, o estudo brasileiro conseguiu demonstrar não
apenas que o vírus da zika consegue reduzir os tumores, mas também inibir a
metástase. No caso do glioblastoma, a metástase é rara, já que o paciente
costuma morrer antes que o tumor se alastre. O estudo brasileiro também mostrou que depois de atacar as
células-tronco tumorais, o vírus da zika não consegue se reproduzir com
eficiência – o que evitaria que os pacientes tratados contra o câncer ficassem
doentes com a infecção viral. “Normalmente, quando um vírus infecta uma célula, ele
sequestra sua maquinaria para se replicar e depois libera uma quantidade imensa
de partículas virais que irão infectar outras células. Mas descobrimos que, por
algum motivo, o vírus não consegue se replicar de forma eficiente na célula de
câncer, porque as partículas virais produzidas são defeituosas, com pouca
capacidade para destruir células normais.”
VACINAS ANTICÂNCER
As células tumorais enganam o sistema
imunológico inibindo as reações responsáveis para ativar as células de defesa -
as células dendríticas. Células tumorais e dendríticas são fundidas em laboratório para formar
uma célula híbrida, que é injetada no organismo e avisa o sistema imunológico
que o tumor é um corpo estranho e deve ser destruído. Há dois tipos de vacinas sendo pesquisadas, uma delas, já em uso,
PREVINE a hepatite B – enfermidade virótica que pode se tornar
cancerígena. Vacinas CURATIVAS atuam quando o câncer já se instalou. Elas estimulam o
sistema imunológico a reconhecer e eliminar as células malignas que
simplesmente não são atacadas por fazerem parte do organismo.
Centenas de milhões de dólares são
gastos anualmente na busca de terapias para destruir células tumorais e poupar
as normais, minimizando os efeitos secundários do tratamento. São as “target
therapies”. São muitas as opções e a escolha depende do tipo do tumor. As
células tumorais não limitam sua reprodução por apoptose (apoptose é uma ordem
para células se “suicidarem”. As células sadias a recebem quando devem morrer
ao completar o ciclo para o qual foram criadas).
Um promissor tipo de terapia se baseia
na preferência que os vírus têm por determinados órgãos, o que permite que os
usemos para transportar substâncias anticancerígenas, sem afetar as células
sadias. Nanopartículas também estão em estágios avançados de pesquisa.
Jayme José
de Oliveira
cdjaymejo@gmail.com
Cirurgião-dentista aposentado
cdjaymejo@gmail.com
Cirurgião-dentista aposentado