segunda-feira, 14 de fevereiro de 2022

SE DEUS NÃO TIVESSE CRIADO O HOMEM

 


PONTO E CONTRAPONTO - por Jayme José de Oliveira

“Por mais brilhante que sejas, se não fores transparente, tua sombra será escura”.

 

 

SE DEUS NÃO TIVESSE CRIADO O HOMEM – 27/07/2.015

SE DEUS NÃO TIVESSE CRIADO O HOMEM, O HOMEM SERIA COMPELIDO A CRIAR DEUS!

Por quê?

E disse Deus: “Façamos o homem à nossa imagem, conforme a nossa semelhança; e domine sobre os peixes do mar, e sobre as aves dos céus, e sobre o gado, e sobre toda a terra, e sobre todo o réptil que se move sobre a terra. (Gênesis, 26)

Qual foi o fator que o diferenciou dos outros seres vivos? A liberdade de agir de acordo com sua vontade e discernimento, o livre-arbítrio, que tanto pode ser usado para o bem como para o mal. No episódio que descrevo adiante, tanto poderia fugir apavorado – não o fez – como usar a potencialidade que lhe fora conferida pelo Criador e se perguntar quem era este Ser tão poderoso – optou pela segunda alternativa – e intuiu Deus.

Na coluna “Comunicação” (27/02/2014) gizei que as duas molas propulsoras da humanidade foram, e são, a curiosidade e a insatisfação. A primeira o impele a procurar respostas para tudo que não compreende e a segunda o instiga a não desistir até alcançar o objetivo.

Há 200.000 anos quando surgiu, vivia num ambiente hostil e, não fora seu cérebro, esta frágil criatura não teria sobrevivido e prosperado. Seria mais uma das inúmeras espécies mal sucedidas da criação que se extinguiram. Graças às suas características singulares inventou e aperfeiçoou armas de defesa e ataque, moldou o meio ambiente à sua vontade, necessidades e conveniências, suplantou todas as demais e é, indubitavelmente, o píncaro da criação.

A jornada foi difícil, áspera e plena de obstáculos. Os animais foram domados ou deles se manteve a salvo pela astúcia, fuga ou construindo abrigos. Aprendeu a cultivar os vegetais ampliando suas fontes alimentares permitindo fixar residência e formar comunidades estáveis. Deixou de ser nômade.

Desde priscas eras analisava os fatos à sua maneira. Um raio incendiando uma árvore afugentava os animais, por mais fortes e bravios que fossem e isso encerrava o episódio. O homem, não!  Conhecia todos os perigos naturais, feras, precipícios, cataratas… mas aquela luz incandescente seguida dum estrondo que tudo destruíam estava fora de sua compreensão. Que poderia ser? Pela vez primeira não atinava com a resposta e isso o inquietava, constrangia, ele não admitia o desconhecimento.

Não conseguindo explicação plausível, concluiu ser algo acima de tudo que podia captar com seus sentidos. Surgiu a ideia do primeiro Deus, na mente do primeiro homem vivendo num aglomerado de seres da mesma espécie. Foi o primeiro, mas não o único. Todas as tribos, de todas as partes do mundo que se seguiram, mesmo isoladas como as na ilha da Páscoa, nas florestas da África e em outros rincões cultuaram seus deuses e os sacerdotes eram seus porta-vozes.

O inexplicável obtinha explicação e a curiosidade satisfeita. Surgiram as religiões. O politeísmo era a regra. Como muitos eram os mistérios, outros tantos os deuses. Foi na Grécia antiga que a mitologia atingiu seu esplendor, se não elaborou respostas para todas as questões, seguramente é a mais rica, estudada e reverenciada de todas. Deuses, semideuses, heróis, sílfides, nereidas, faunos e tudo o mais que puderam imaginar… nada ficou descuidado. Concomitantemente, a  ciência e a arte floresceram.

O monoteísmo surgiu depois, mas, até mesmo a Igreja Católica sinaliza para a Santíssima Trindade, um Deus em três pessoas, o Pai, o Filho e o Espírito Santo. O Judaísmo, o Islamismo, bem como algumas denominações cristãs não aceitam a doutrina trinitária.

Até o presente as perguntas não foram todas respondidas. Jamais o serão a pleno.

“Para cada resposta que obtemos nos surgem dez novas questões, mas o que nunca vai acabar é a procura do ser humano pelo conhecimento”. (Jayme J. de Oliveira)

“Mesmo quando era jovem, não conseguia acreditar que, se o conhecimento humano oferecesse perigo, a solução seria a ignorância. Sempre me pareceu que a solução tinha que ser a sabedoria. Qualquer avanço tecnológico pode ser perigoso, mas, os humanos não seriam humanos sem eles. (Isaac Asimov)

Com a evolução e o tempo o homo sapiens desvendou os segredos do raio e do trovão, dos vulcões, dos terremotos e da maioria dos fenômenos da natureza. O desconhecimento se deslocou para outros campos, mais complexos, mais intrigantes, porém a curiosidade com sua companheira inseparável, a insatisfação, continuam tão incrustados na mente humana como por ocasião da primeira dúvida e não cessarão jamais. É o que impulsiona o homo sapiens cada vez mais para o domínio do desconhecido mas não incognoscível.

 

 

Em 13/03/2017 o Papa Francisco fez um dos seus pronunciamentos que ficarão marcados na sua trajetória já tão impactante:

“Não é necessário crer em Deus para ser uma pessoa boa.                                                                   De certa forma, a ideia tradicional de Deus não está atualizada.                                                  Alguém pode ser espiritual, porém não necessariamente religioso.                                                  Não é necessário ir à igreja e dar dinheiro.                                                                                       Para muitos, a natureza pode ser uma igreja.                                                                              Algumas das melhores pessoas da história não criam em Deus, enquanto que muitos dos piores atos se praticaram em seu nome.

Coluna publicada por mim já concordava com tese semelhante, embora enfocada sob outro prisma.

Voltaire, pensador iluminista, anticlerical, poderia ser incluído no contexto do Papa Francisco. É de Voltaire o texto a seguir:

Agrego Voltaire, poderia acrescer Mahatma Gandhi, Nelson Mandela, Martin Luther King e inúmeros mais.

 

 

ORAÇÃO A DEUS

  

Prece Pela Tolerância – Voltaire

 

Não é mais aos homens que me dirijo.

É a Você, Deus de todos os seres, de todos os mundos e de todos os tempos.

Que os erros agarrados à nossa natureza não sejam motivo de nossas calamidades.

Você não nos deu coração para nos odiarmos nem mãos para nos enforcarmos.

Faça com que nos ajudemos mutuamente a suportar o fardo de uma vida penosa e passageira.

Que as pequenas diferenças entre as vestimentas que cobrem nossos corpos, entre nossos costumes ridículos, entre nossas leis imperfeitas e nossas opiniões insensatas não sejam sinais de ódio e perseguição.

Que aqueles que acendem velas em pleno dia para Te celebrar, suportem os que se contentam com a luz do sol.

Que os que cobrem suas roupas com um manto branco para dizer que é preciso Te amar, não detestem os que dizem a mesma coisa sob um manto negro.

Que aqueles que dominam uma pequena parte desse mundo, e que possuem algum dinheiro, desfrutem sem orgulho do que chamam poder e riqueza e que os outros não os vejam com inveja, mesmo porque Você sabe que não há nessas vaidades nem o que invejar nem do que se orgulhar.

Que eles tenham horror à tirania exercida sobre as almas, como também execrem os que exploram a força do trabalho.

Se os flagelos da guerra são inevitáveis, não nos violentemos em nome da paz.

Que todos os homens possam se lembrar de que são irmãos!

   Voltaire

 

Na página 80 do livro “ORIGENS” (traduzido para o português em outubro de 2017) Dan Brown (autor de best-sellers, entre os quais “O CÓDIGO DA VINCI”) escreve, e é a base de toda a obra:     

“Os primeiros seres humanos se sentiam assombrados com seu universo, especialmente com relação aos fenômenos que não conseguiam entender racionalmente. Para resolver esses mistérios, eles criaram um vasto panteão de deuses e deusas com o objetivo de explicar qualquer coisa que estivesse além de sua capacidade de compreensão: o trovão, as marés, os terremotos, os vulcões, a infertilidade, as doenças e até o amor.                                                                                  – Para os gregos antigos, o fluxo e refluxo do oceano eram atribuídos aos humores instáveis de Poseidon                                                                                                          – Para os romanos, os vulcões eram o lar de Vulcano, o ferreiro dos deuses, que trabalhava numa forja gigantesca embaixo da montanha, fazendo com que as chamas saíssem pela chaminé                                                                                             Os antigos inventaram deuses incontáveis para explicar não apenas os mistérios de seu planeta, mas também, os de seus corpos. A infertilidade era causada pela perda dos favores da deusa Juno. O amor era o resultado duma flechada de Eros.                 Quando os antigos experimentavam lacunas em sua compreensão do mundo, preenchiam-nas com deuses. No entanto, com o decorrer dos séculos, o conhecimento científico aumentou. À medida que as lacunas na compreensão do mundo natural foram desaparecendo, nosso Panteão de deuses começou a encolher”.

Recém iniciei a leitura, suponho, contudo, que evoluirá para o ponto de desmitificar as religiões tal como as conhecemos. Aliás, isso já ocorreu parcialmente como foi assinalado no parágrafo anterior. Em meu entendimento, a evolução se direcionará sempre mais para o encontro, num futuro talvez muito distante, da criatura com o Criador, seja lá o que isso signifique, segundo os desígnios há muito concebidos. Não se trata de determinismo, que significaria a anulação do livre arbítrio, mas um caminho natural da evolução até chegar ao apogeu.

 

Jayme José de Oliveira
cdjaymejo@gmail.com
Cirurgião-dentista aposentado

 


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