sábado, 26 de novembro de 2022

O TETO DE GASTOS

 


PONTO E CONTRAPONTO - por Jayme José de Oliveira

“Por mais brilhante que sejas, se não fores transparente, tua sombra será escura”.

 

TETO DE GASTOS

Os economistas sustentam que o aumento dos gastos públicos sem sustentação afeta o controle da inflação e a expansão do crescimento econômico do país. Este é um dos desafios que terão e ser enfrentados pelo presidente eleito.

Ambos os candidatos que disputaram o segundo turno da eleição se esmeraram em prometer mundos e fundos na caça dos votos necessários. Não há sequer previsão orçamentária para a manutenção do Auxílio Brasil de R$ 600 por beneficiário que, se concretizado elevará o déficit primário (resultado do saldo negativo do saldo entre receitas e despesas do governo).

Não é terrorismo irresponsável, é uma visão realista, afirma Mauro Rocklin, doutor em Economia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro e professor de Economia da Fundação Getúlio Vargas. A manutenção do Auxílio Brasil, mais a proposta de Bolsonaro de conceder 13º salário para as mulheres e a de Lula em contemplar com R$ 150 reais crianças até seis anos, ainda não tem o custo estimado. Será, certamente, de grande monta.

Não resta a menor dúvida ser temerário falar em qualquer aumento de gastos sem indicar de onde sairão os recursos. Alguém pode sugerir algo que não seja aumento de impostos? Realocação de verbas de outros locais será como “despir um santo para vestir outro”.

O Teto de Gastos criado pelo Congresso Nacional em 2016, que seria vigente por 20 anos, limitaria o aumento da inflação, providência considerada como primordial pela maioria dos economistas. Gastança sem limites representará um caos econômico a curto prazo e insolvência no futuro. Não podemos jogar nas costas dos nossos filhos e nas dos filhos dos nossos filhos o fardo da nossa irresponsabilidade.

Lula descarta peremptoriamente este freio e o mesmo pensa Bolsonaro. Ante a possibilidade de se tentar qualquer modificação na lei, o ex-diretor de Assuntos Internacionais do Banco Central Alexandre Schwartsman lembra que é cláusula da Constituição. Para que deixe de existir é necessária a aprovação de 3/5 do Congresso, senadores e deputados federais. Na eventualidade de que esta ignomínia seja aprovada será necessário estabelecer a fonte de renda que permita a economia funcionar ou se instalará o caos no Brasil.

Samuel Pessoa, pesquisador do Instituto Brasil de Economia avalia que Não há saída que não se alicerce no aumento de impostos, redução dos incentivos fiscais (que atraem novos investimentos) ou enxugamento de gastos. A última alternativa tende a piorar os já deficientes serviços públicos. Passar a tesoura no Orçamento Secreto, menina dos olhos dos deputados e senadores? História da Carochinha, alguém acredita que será aprovado no Congresso?

Em última instância, quem tem a tesoura nas mãos pode cortar na carne dos eternos achacadores do erário público. Vale para o Orçamento Secreto. Não há dúvidas que as classes pobres têm maior direito e necessidade que obras com destino eleitoral. Ah! Não esqueçamos as milionárias obras financiadas no exterior, executadas pela Odebrecht e outras empreiteiras. As que estiverem inadimplentes deverão ter sua cobrança executada com prioridade máxima.

Esses assuntos não foram abordados nas campanhas eleitorais dos candidatos que disputaram o 2º turno.

Schwartsman aposta que a trajetória ruim do déficit e da dívida trará dificuldades e impulsionará a alta da inflação por um período longo ainda mais sabendo-se que quanto mais se adia o combate à inflação, mais custosa ela se torna e, sem a menor dúvida, os maiores prejudicados serão as classes da base da pirâmide, as mesmas que são invocadas constantemente.

“A tendência de procurar soluções fáceis para problemas complexos continua sendo, na forma do populismo de direita ou de esquerda, uma grande força eleitoral”. (Fernando Gabeira em “Democracia Tropical)

Jayme José de Oliveira
cdjaymejo@gmail.com
Cirurgião-dentista aposentado


O FALCÃO DE ESPARTA

 


PONTO E CONTRAPONTO - por Jayme José de Oliveira

“Por mais brilhante que sejas, se não fores transparente, tua sombra será escura”.

 

O FALCÃO DE ESPARTA

Os séculos passam, os milênios se esboroam, mas a humanidade intrinsecamente pouco se modifica. As paixões, os amores, os ódios, a cobiça, permanecem latentes e quando chega a hora... estrugem com toda a intensidade que parecia sopitada.

Conn Iggulten escreveu “O Falcão de Esparta” relembrando saga como a de Leônidas e os 300 espartanos enfrentando 1 milhão de persas no desfiladeiro de Termópilas. Durante 3 dias resistiram até que o traidor Efialtes guiou o formidável exército por um atalho. Só então foram trucidados pelo ataque na retaguarda.

No prólogo do livro, Dario, filho de Xerxes, instrui seu primogênito Artaxerxes como sobreviver naquele meio conturbado, mesmo que fosse necessário assassinar seus afins, isso para não ser morto por eles.

Mudaram os tempos, as armas, as táticas, só não mudou a capacidade do homem em usar todos os artifícios, por mais hediondos que sejam, no afã de continuar no comando das nações ou conquista-lo usando, repito, quaisquer subterfúgios.

Há mais de 2 mil anos Cícero pronunciou 4 discursos no Senado Romano que se tornaram conhecidos como as Catilinárias. Num deles, verberando todo seu asco por Catilina vociferou: “Quousque tandem Catilina, abutere patientia nostra”? (Até quando, Catilina, abusarás da nossa paciência)?

Continua tão atual como o foi nos tempos pretéritos. Acrescentou num momento de exasperação: “Hoc loco sacrus est puer, extra migite”. (Este lugar é sagrado, guri, vá urinar lá fora).

Abordemos excertos do prólogo de “O Falcão de Esparta”.

Enquanto andava pelo meio da rua o Grande Rei exibia a barba em cachos negros definidos. Soldados imperiais limpavam o aminho para o rei andar. O silêncio era tão pesado que o menino ouvia os passarinhos cantarem.

A verdade era que algumas palavras não podiam ser ouvidas. Havia sátrapas (déspotas) demais, reinos demais cuja coroa ele esmagava sob suas sandálias.

Enquanto os dois andavam o menininho enviava olhares furtivos na direção do pai, adorando-o e confiando nele para tudo. O jovem Artaxerxes igualou seu passo ao do rei, assim, pai e filho caminhavam como se fossem as únicas pessoas vivas no mundo.

- As fronteiras da Pérsia não podem ser percorridas a pé por toda uma vida, mas não me foi dado, menino. Quando mataram meu pai a coroa passou para o meu irmão. Ele a tomou... e só governou um mês, até ser assassinado.

- E o senhor se vingou de quem o matou – disse Artaxerxes.

- Isso. Quando o sol nasceu naquele dia, éramos três, três irmãos. À noite, eu estava sozinho. Salpicado de sangue... mas era rei.

Artaxerxes não sabia porque o pai o chamara naquele dia nem porque até os famosos guardas imperiais estavam fora de vista. O pai não confiava em ninguém, mas caminhava a sós com o seu filho mais velho, com catorze anos. Isso enchia Artaxerxes de orgulho e felicidade.

- Os reis precisam de mais de um filho – continuou o pai. Um rei com apenas um filho é um desafio para os deuses assim como para todos os seus inimigos.

O pai continuou.

- Mas se este primogênito sobreviver e se tornar homem, um jogo diferente começa. Se, então, ele tiver irmãos, são eles os únicos no mundo que podem lhe tirar tudo.

- Pai, disse Artaxerxes de repente – Ciro nunca me faria mal.

- Você é meu filho e meu herdeiro. Se for levado, Ciro será rei.

O rei respirou fundo, querendo que Artaxerxes compreendesse.

- Meu filho, amo vocês dois, mas quando estiver no meu leito de morte, nesse último dia eu o chamarei de volta... e você terá de mata-lo. Porque, se o deixar vivo depois disso, sem dúvida ele o matará.

Artaxerxes viu as lágrimas cintilarem nos olhos do pai. Era a primeira vez que via uma demonstração de emoção como esta, e isso o abalou.

- Pai, acho que o senhor está enganado, mas me lembrarei do que disse.

O rei se levantou, estava corado. Por uma emoção difícil de dizer.

- Então lembre-se disso também. Se disser uma palavra a Ciro, qualquer que seja, sobre esse assunto, você estará cortando a própria garganta. Chegará o dia em que ele virá até você e lhe tomará o trono. E, se eu estiver vivo nesse dia, se ele vier a mim depois, mesmo que tenha sangue nas mãos... mesmo assim, eu não terei outro filho, por isso o abraçarei.

Entendeste, Artaxerxes?

Jayme José de Oliveira
cdjaymejo@gmail.com
Cirurgião-dentista aposentado


sexta-feira, 18 de novembro de 2022

SÓCRATES, THOMAS MOUS E JOHN LE CARRÉ

 


PONTO E CONTRAPONTO - por Jayme José de Oliveira

“Por mais brilhante que sejas, se não fores transparente, tua sombra será escura”.

 

SÓCRATES, THOMAS MORUS E JOHN LE CARRÉ

A insatisfação, complemento umbilical da curiosidade, em conjunto permitem ao homo sapiens desvendar os mais recônditos escaninhos da natureza. Não fora a curiosidade, ainda estaríamos habitando em cavernas. 

A nossa civilização se desenvolveu porque a insatisfação não permitiu que nos deitássemos sobre os louros das primeiras conquistas. Pensas que o leito de musgos e folhas secas sobre as quais repousas são o máximo que podes auferir? Levanta e elabora algo melhor, mais higiênico, mais confortável, espicaçou a insatisfação.

E o homo neanderthalensis, há 350 mil anos, um primata na legítima acepção da palavra iniciou a longa, sofrida, laboriosa jornada que nos trouxe até aqui. E seguimos rumo a... não sabemos para onde, apenas temos a certeza que há muito caminho a trilhar.

John Le Carré escreveu “Amigos absolutos”, uma verdadeira diatribe ao nosso mundo dicotomizado. É dele na página 199 que reproduzo um texto:                                                                                                                              “Nos anos e meses em que fui retirado de Berlim Ocidental entrei em uma escuridão total. De que valiam alguns carros incendiados e janelas quebradas? Nosso movimento era inspirado não pela vontade das classes oprimidas, mas pela culpa liberal dos ricos. Em meu tumulto pessoal considerava as miseráveis alternativas à minha disposição. A adoração ao Deus da prosperidade inspirada pelos americanos me espicaçava ao ponto da demência. Se queremos construir um mundo melhor do que este, eu perguntava a mim mesmo: Para quem nos voltamos, que ações apoiamos, como podemos frustrar a marcha interminável da agressão capitalista imperialista”? (Sasha, personagem anarquista do livro “Amigos Absolutos” de John Le Carré, pg. 199).

Thomas Morus, em 1516, publicou “Utopia” que até hoje é ufanada por quem não leu ou leu e não entendeu patavinas.

Aos 17 anos li pela primeira vez e desatei em gargalhadas ante os desatinos inseridos. Aos 50 anos reli e, desta vez, fiquei chocado e não pude acreditar que haja alguém que considere sua “Bíblia”.

Rápidos traços da obra, não me permito maiores considerações:

Revoltado com as condições desumanas em que viviam as classes da base da pirâmide na Inglaterra: 16 horas de labor diárias, sem descanso semanal, sem férias, sem aposentadoria, sem assistência médica, sem um mínimo de dignidade... UM HORROR! Descreveu em contrapartida uma sociedade igualitária na “Ilha da Utopia”. Será verdadeiro o ´”Paraíso”?

1.   Não havia dinheiro, todos eram iguais. (???)

2.   O ouro era desprezado, fabricavam-se penicos com ele... mas era usado para financiar mercenários já que não possuía exército.

3.   Não havia ascensão entre as gerações. Na prática, quem nascia filho de pedreiro jamais ascenderia a mestre-de-obras.

4.   Professores, apenas os 2.000 sacerdotes e quem discutia o mestre era, se não se enquadrasse, relegado ao status de escravo.

5.   Se todos eram iguais perante a lei, como admitir a existência de escravos oriundos de prisioneiros de guerra e dos inconformados com seu status?

“Escravidão e ordem política” é uma comparação entre “Política” de Aristóteles e “Utopia” de Thomas Morus.

Excerto do artigo escrito por Felipe Landim Ribeiro Mendes – Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Departamento de História da Universidade de São Paulo (USP):                                                                                 “Este artigo pretende demonstrar como a escravidão aparece como um ponto fundamental nas ordenações políticas de Aristóteles e Thomas Morus. Por meio de uma análise da “Política” e da “Utopia”, busca-se esclarecer como os dois filósofos enxergam o cativeiro como algo além do que uma simples relação de dominação ou modelo de trabalho, encontrando na instituição escravagista uma das balizas de suas sociedades ideais”.

À primeira vista esta coluna aborda assuntos tão divergentes, opiniões tão contraditórias que o nexo parece ter dado um adeus e se evaporado. Contudo, analisem as opiniões dos maiores experts da atualidade e mesmo do passado, verificarão que o nexo tem sido raqueteado para lá e para cá como se uma bola de pingue pongue fosse.

O anseio do colunista é que, mais dia menos dia se encontre um denominador comum, a humanidade esqueça suas divergências e possamos, finalmente, viver em harmonia.






Jayme José de Oliveira
cdjaymejo@gmail.com
Cirurgião-dentista aposentado


sexta-feira, 11 de novembro de 2022

CPNHECE-TE A TI MESMO

 


PONTO E CONTRAPONTO - por Jayme José de Oliveira

“Por mais brilhante que sejas, se não fores transparente, tua sombra será escura”.

 

CONHECE-TE A TI MESMO

Na porta do templo de Apolo, em Delfos, está escrito                             “Conhece-te a ti mesmo”                                                                         As dificuldades de convivência derivam do fato de que dificilmente as pessoas se conhecem a si mesmas, quanto mais aos outros, suas necessidades e anseios.

Não desejar os excessos é tão incongruente para a maioria que os exageros abundam. Pensam: por que devo me privar das coisas que me dão prazer se labutei por elas? Quando alcançar uma estabilidade econômica que permitirá satisfazer os anseios com os quais sonhei nos tempos de privações sinto-me no direito de usufruir.

Cumpre aqui estabelecer o que são excessos incompatíveis com um relacionamento harmonioso. Proporcionar uma vida confortável para si e os dependentes não é um ato extravagante. Esbanjar em festas suntuosas para tripudiar e esnobar jamais atrairá a admiração, inclusive dos participantes convidados para a esbórnia.

Vivemos numa sociedade estratificada muito bem representada pela figura de uma pirâmide que desnuda um conjunto de desigualdades que atingem grupos de pessoas, separando-as de alguma forma. Este é um fato histórico bem representado quando Jesus estava na casa de Simão e entra uma mulher que derrama sobre a sua cabeça um perfume precioso e caro – valor do salário de um trabalhador. Alguns presentes, entre os quais Judas, o traidor, ficaram indignados e consideraram o fato um desperdício de dinheiro. Deveria ser destinado aos pobres.

A resposta de Jesus, “os pobres sempre tendes convosco. Mas a mim em tereis sempre” (Mc,14/7).

Atentem para: “podeis fazer-lhes o bem quando quiserdes”. É uma realidade que a distribuição do dinheiro gasto seria uma panaceia paliativa por um tempo. O verdadeiro sentido da caridade é proporcionar melhoria de vida permanente.

Diz o ditado que “é melhor ensinar a pescar do que dar o peixe” quando se quer ajudar ao próximo, mas devemos atentar que nem sempre poderá ser assim, pois, às vezes, precisa-se dar primeiro o peixe para que o ser humano carente não morra de fome antes de conseguir aprender a pescar.

Resumindo, devemos labutar para melhorar a situação de penúria com políticas de emprego com salário justo, com moradia digna, educação, acesso à saúde pública, etc. Distribuir R$600 reais representa entregar um peixe, ascensão social para que possa prover o sustento próprio e dos dependentes equivale a ensinar a pescar.

Jayme José de Oliveira
cdjaymejo@gmail.com
Cirurgião-dentista aposentado